“O galope do sonho”, artigo de Anoushe Duarte Silveira.
“Arte pra mim não é produto de mercado. Podem me chamar de romântico. Arte pra mim é missão, vocação e festa”. O autor dessa frase é o escritor, dramaturgo, filósofo e poeta Ariano Suassuna. O autor paraibano de obras como O Auto da Compadecida e A Pedra do Reino vai ser o candidato brasileiro na disputa pelo Prêmio Nobel de Literatura de 2012. Estaremos muito bem representados…
Ariano Suassuna foi um dos fundadores e diretores do Movimento Armorial, que tem como objetivo criar uma arte erudita a partir de elementos da cultura popular do Nordeste. Como ele próprio explicou no Jornal da Semana, Recife, em 1975, a arte armorial “é aquela que tem como traço comum principal a ligação com o espírito mágico dos folhetos do Romanceiro Popular do Nordeste, Literatura de cordel, com a música de viola, rabecaou pífano que acompanha seus ‘cantares’, e com a Xilogravura que ilustra suas capas, assim como com o espírito e a forma das Artes e espetáculos populares com esse mesmo Romanceiro relacionados”.
Suassuna sempre estimulou a criação de uma literatura dramática, de raízes fincadas na realidade brasileira, particularmente na nordestina e faz uma intransigente defesa da cultura popular e do Brasil real — formado pelos “despossuídos, famintos, analfabetos e semi-alfabetizados; isto é, todos aqueles que foram marginalizados pela injustiça fundamental do processo histórico brasileiro” .
Assim como João Cabral de Melo Neto, José Lins do Rego e Guimarães Rosa, Ariano Suassuna foi fortemente influenciado pela literatura de cordel — literatura popular em verso. Em o Auto da Compadecida, por exemplo, é inesquecível a perspicácia do personagem João Grilo, enterrando um cachorro em latim:
Na cidade de Taperoá – Paraíba, João Grilo, “um amarelo muito safado”, chamado assim por protagonizar com muita esperteza, confusões em busca de dinheiro e comida, ao lado de Chicó, seu fiel amigo, consegue “enterrar um cachorro em latim”, convencendo o sacristão e o padre a fazer o enterro do cachorro, inventando um testamento, em que o bicho acrescentaria, em troca do enterro, dez contos de réis para o padre e três para o sacristão. Com um “pequeno arranjo” inclui também o bispo no testamento, que imediatamente passa a concordar com o enterro do cachorro conforme “o código canônico”.
Todo esse comprometimento com uma literatura que expresse as aspirações e o espírito do povo brasileiro e toda essa imersão na cultura popular talvez explique porque para ele arte seja missão, vocação e festa. Como eu já disse, estamos muito bem representados. Agora nos resta torcer e ter esperança! Como o próprio Ariano Suassuna ensina: “Eu digo sempre que das três virtudes teologais, sou fraco na fé e fraco na qualidade, só me resta a esperança.”
“Tenho duas armas para lutar contra o desespero, a tristeza e até a morte:o riso a cavalo e o galope do sonho. É com isso que enfrento essa dura e fascinante tarefa de viver.” Ariano Suassuna.
Anoushe Duarte Silveira é brasiliense, jornalista e bacharel em direito, pós graduada em documentário – com especialização em roteiros. Possui textos publicados em jornais e revistas e nos blogs http://www.amigas-da-leitura.blogspot.com/ e http://www.recantodasletras.com.br. Possui livros publicados em coautoria, selecionados em concursos literários.