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Fui assistir com meu filho ao filme da Disney “Carros 2”. No decorrer da história, Mate, personagem que é o melhor amigo do superastro Relâmpago McQueen, amassa a sua lataria numa de suas divertidas aventuras com McQueen. Quando precisou se disfarçar (já que é um filme de ação), disseram a ele que seria preciso dar um jeito em seus amassados e seria bom porque ficaria novinho em folha. Prontamente ele respondeu que jamais consertaria seus amassados, porque são lembranças dos bons momentos que passou com seu melhor amigo.
Na mesma hora eu me lembrei das muitas marcas que trago em meus joelhos. Marcas que me remetem a lembranças de uma infância muito bem vivida. Cada ralada, tropeçada ou queda me faz recordar dos amigos, das brincadeiras de subir em árvores, de andar de bicicleta, das corridas de pique e pega, queimada. Coisa que nem sei se as crianças de hoje em dia brincam mais. Tenho os joelhos bem marcados por uma infância feliz!Como a lataria do Mate…E acho que o mesmo vale para as marcas do tempo em nosso rosto. Elas estão lá, não propriamente nos lembrando só de coisas boas, mas efetivamente nos mostrando que adquirimos experiência, que vivemos!
Sei que é difícil lidar com o fato de estarmos envelhecendo desde que nascemos. E é mais difícil ainda quando vivemos em uma sociedade onde se valoriza sempre o jovem, o novo, o rápido, o antenado, o plugado. Tudo isso tem a sua importância, mas acho que precisamos dar o devido valor também à experiência e, não adianta, só o tempo traz. Assim como traz nossas marcas de expressão, rugas e manchas na pele.
Olho para minha avó de 98 anos e fico pensando na quantidade de histórias que ela presenciou, o quanto seus olhos, hoje já cansados, viram, quantos passos dados, quantas decisões tomadas, quantos momentos de alegria, de tristeza, quanto choro repreendido… Cada marca é o registro de sonhos realizados ou contidos, dias compartilhados e solitários, aprendizado acumulado ou desperdiçado… Registro de vida.
Assim como no desenho, espero ter sabedoria suficiente para aceitar todas as marcas com carinho, todas a seu tempo, como verdadeiras lembranças de momentos conquistados com muita vida. Começamos jovens e com rostos lisos, como páginas em branco, ávidas por serem escritas, desenhadas, pintadas e sem estrutura alguma para suportar os rasgos e amassados. Só o tempo é que nos prepara para as canetadas da vida e nos faz perceber que há beleza e muito aprendizado nisso. Há muita beleza no acúmulo de experiência e nas consequentes marcas adquiridas. Encarar cada marca, cada ruga como uma conquista (já que ter mais um dia de vida é uma grande conquista) pode ser uma excelente maneira de envelhecer em paz e feliz consigo. Afinal, a beleza está na maneira de sentir e nos olhos de quem vê. Olhe-se de um jeito diferente e não deseje ser para sempre uma folha vazia!
Anoushe Duarte Silveira é brasiliense, jornalista e bacharel em direito, pós- graduada em documentário – com especialização em roteiros. Possui textos publicados em jornais e revistas e nos blogs http://www.amigas-da-leitura.blogspot.com/ e http://www.recantodasletras.com.br. Possui livros publicados em co-autoria, selecionados em concursos literários.